Depois dos variados processos de composição do albúm durante os últimos tempos chega o momento de registar todo o material seleccionado.
Se a composição e constituição de música é para mim um prazer espontâneo, o estúdio sempre funcionou como uma espécie de cela sufocante e “stressante”, sobretudo porque me cabe gravar toda a parte da bateria acústica. Todo o “stress” acaba por se tornar positivo quando se começa a perceber o corpo e dimensão dos registos e “takes” que se vão gravando.12h30: Tudo a postos para começar a gravar, depois de uma reunião matinal com o “chefe de comandos” Daniel....afinações e som de bateria acertados; silêncio, microfones...acção.
13h40: Depois de 3 ou 4 “takes”, não me lembro ao certo, tínhamos a primeira faixa de bateria gravada, tendo em conta que não poderia ser definitiva.
14h00: O metrónomo e a banda não combinam. Opto por tocar sozinho a “medea” conseguindo um bom resultado após 2 “takes”.
15h00: Com algumas faixas já gravadas chega a hora de ir almoçar. As francesinhas em Viseu são péssimas e caras, não aconselháveis.
Após esta refeição veio a continuação das gravações “takes”, “takes”, e mais “takes”...acumulando material de bateria.
19h30: Comecei a sentir os meus dedos a arder, tinha a pele “esfolada”. Algures num “take” qualquer sinto as mãos húmidas, e agora sim a parte “core” da cela sufocante, de repente vejo sangue que se espalha pelos timbalões em pintas rubras, PÁRA TUDO, há sangue...
Tinha a mão esquerda numa massa de sangue e gordura humana...intervalo, curativos, pensos e algodão. Ao mesmo tempo a minha vista esquerda denunciava uma infecção devido ao abuso das lentes de contacto e começava-se a operar em mim uma transformação “Kafkiana”.
22h00: Jantar, “um monstro” num fast-food. Mãos ligadas e olho inchado, “o monstro” está à solta!
23h00: De volta à cela, mais “takes”, mais suor, mais sangue.....
02h00: Final do primeiro dia de gravações. Recolhemos 6 amostras válidas de bateria boa média não fossem os meus dedos inchados. Já não me reconhecia, disforme, ao frio de Viseu e sem francesinhas de jeito para comer...
Dedico todo o esforço de gravação de estúdio deste albúm a todos os artistas que exploraram o que há de mais negro e violento para nos dar o mais claro e o mais belo.
Escrito por José Barbosa: Bateria e percussão “human cycle”